quarta-feira, 9 de maio de 2012

Lavagem

Estes primeiros raios de sol vêm perfumar a cidade limpa pelas chuvas de um mês inteiro.
A cidade é percorrida, hoje como ontem, por uma varina que tem escamas de peixe na cara e as chinelas impregnadas de tripas de pescado. Mas hoje ela cheira melhor. Porque é penetrada por uma luz que ignora os podres e foca a beleza, a tradição e a ordem.
Numa rua desta cidade, eu vi uma placa com letras gravadas em baixo relevo, daquelas que enumeram os moradores de uma casa e se colam nas caixas de correio, que dizia: "se trouxer alguma coisa para Amélia Costa da casa 6, por favor toque à campainha". E esse objeto, lido à luz do sol, perdeu o bizarro e o ridículo e deu à cidade a graça das crianças, ou dos velhos, que são tão parecidos.
Esta cidade tem uma igreja onde eu nunca entrei e, quando hoje o tencionava fazer, fechou-me as portas, eu teria que adquirir bilhete para entrar. Preferi sentar-me aqui, à soleira, a aquecer ao sol. Este sol que me lava e me anuncia novas cidades dentro desta.

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